terça-feira, 19 de maio de 2009

Um Pouco de História - A Toponímia da Ribeira Chã

A actual freguesia da Ribeira Chã, situada entre a Vila de Água de Pau e Vila Franca do Campo, tem a nascente o pitoresco lugar da Praia e logo a seguir a freguesia de Água de Alto. A presença da Serra de Água de Pau originou entre outros os topónimos de Água de Pau, Ribeira Chã e Água de Alto. A Ribeira Chã é uma freguesia rural onde habitou sempre uma população que vivia da terra para a terra. A Ribeira Chã é um lugar habitado desde o tempo de Gaspar Frutuoso, pois o cronista na sua obra “Saudades da Terra” faz, referência a isso. No aspecto religioso, dependia da igreja de Nossa Senhora dos Anjos, de Água de Pau, que lhe ficava mais perto, sobretudo atravessando pelos caminhos e atalhos de outros tempos. O primeiro templo que existiu foi a ermida de Nossa Senhora da Ajuda manda edificar pelo casal José Botelho Veloso e Maria de Frias no ano de 1724. Ficava situada junto ao mar, ao lado poente de quem sobe a primeira curva do Pisão.
Vivendo perto do mar e dispondo de belas praias, os habitantes da Ribeira Chã não se dedicaram à actividade piscatória. Preferiram sempre os trabalhos agrícolas, as pastagens e os matos que lhe bastavam para as suas necessidades do dia-a-dia.
Para norte, o terreno vai-se elevando gradualmente e as terras de cultivo vão dando lugar às pastagens, matas e matos até aos visos da serra. Para sul, o mar com suas costas formam boas praias e rochas de bons pesqueiros. Para nascente, separada da freguesia de Água de Alto por profundas grotas abertas pela erosão das águas pluviais num solo de materiais pulverulentos, onde se encontra a Ribeira da Praia que no inverno era por vezes tão caudalosa que destruía as pontes. Para poente, existem também grotas, igualmente motivadas pelo declive e chuvas. Abrigada dos frios do norte e exposta ao soalheiro sul, os habitantes tem como principal actividade nos dias de hoje a lavoura. No entanto muitos deles trabalham hoje fora da freguesia, principalmente no comércio ou na indústria. As suas necessidades comerciais e administrativas dependiam da antiga Vila de Água de Pau. Actualmente, estão dependentes da vila da Lagoa, que lhe fica muito mais longe que Vila Franca do Campo.
A Ribeira Chã não está ligada a factos históricos de relevo, nem possui monumentos de celebridade. As suas habitações surgem, agradavelmente dispersas dos lugares que a dominam panoramicamente.
A sua toponímia dá-nos o aspecto ancestral mais curioso da sua vivência. Ali não há o artificialismo subserviente de nomes políticos ou de datas que quase ninguém conhece o significado. Os nomes das vias públicas ou dos lugares ainda são os mesmos do tempo dos seus antepassados. Veja-se os nomes das suas principais vias de comunicação:
Rua dos Arrifes, a maior e mais importante da localidade. Terá origem do seu nome relação com a freguesia suburbana de Ponta Delgada? Este topónimo aparece na freguesia da Candelária numa canada que atravessa da estrada nacional até quase à cumieira das Sete Cidades.
Rua de S. José, certamente em homenagem ao santo padroeiro da Ribeira Chã, desde meados do século XIX. Com este topónimo há vias públicas noutros lugares da ilha, tais como: em Rabo de Peixe, Ribeira Seca (Ribeira Grande), no Rosário, da Vila da Lagoa e em Santa Barbara, da Ribeira Grande.
Rua do Pisão, nome que não se repete em nenhuma via pública desta ilha que seja habitada.
Canada do Botelho. Tem origem antroponímica e logicamente tem origem em pessoas que usavam este nome e que ali viviam ou possuíam bens. Este antropónimo aparece em outros lugares desta ilha, como na Ribeira Grande, Livramento e São Vicente Ferreira. Este não sabemos quem lhe deu origem, mas o do Livramento vem de Jerónimo Botelho de Macedo e o da Ribeira Grande vem de um dos filhos ou netos do Capitão Nicolau de Arruda Botelho, pois os filhos foram para o Brasil e só um trouxe de lá mais de seis arrobas de ouro que meteu na Casa da Moeda em Lisboa, alem do que trouxe para casa. Os netos daquele Capitão, alguns nascidos no Brasil, (do ciclo do ouro) tiveram suas casas ali e um deles começou a edificar uma grande casa no cimo daquela rua.
Rua do Caldeirão, em local que se situa entre esta freguesia e a estrada nacional. Em Água de Alto há também uma rua com este nome.
Rua da Boavista, é uma curiosa denominação que também aparece nos Arrifes, nas Calhetas, Rabo de Peixe, Ponta Garça, Água de Alto, Maia, Ribeirinha, Lagoa, Santo António Nordestinho e Ponta Delgada.
Rua dos Quatro Alqueires. É o único nesta ilha, em vias públicas habitadas.
Rua da Igreja. É um topónimo muito vulgar nesta ilha e que só por si invoca o aspecto religioso da sua população.
Oxalá que este grande exemplo que nos tem dado o povo da Ribeira Chã fosse seguido pelas outras povoações desta ilha. A toponímia micaelense era imensamente castiça. Com o advento do regime republicano as edilidades começaram a sua obra de destruição. Para memoriar factos e políticos que nada tinham a ver com os Açores, foram sacrificados os mais invocadores nomes da nossa tradição multisecular. Eram nomes sem significado de autonomia que as edilidades impunham a uma população em nome de quem governavam. Assim, perdeu-se, não irremediavelmente, a pitoresca toponímia micaelense no que Ponta Delgada deu o pior dos exemplos.
Informação Retirada do Boletim Despertar de 5 de Março de 2009

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